
Após semanas marcadas por chuvas intensas e alagamentos, os moradores de Eldorado do Sul, na Região Metropolitana de Porto Alegre, começam a retornar para suas casas. Com a água finalmente recuando, o que permanece agora é o desafio emocional de recomeçar em meio a ruínas e lembranças do que foi perdido.
Os sinais da destruição estão por toda parte: móveis empilhados nas calçadas, paredes manchadas, estruturas comprometidas. “Com a casa vazia, a gente nem sabe se está em casa ou ainda no abrigo”, desabafa o agente funerário Ciro Becker. Ele relata que ainda acorda sobressaltado durante a madrugada, tomado pelo medo de ver novamente a água invadindo a rua.
Ciro ficou isolado com sete familiares no segundo andar da residência por uma semana. O resgate só chegou após dias de espera. “Me tiraram quando eu já estava infartando”, lembra. “Ver minha irmã sendo levada numa retroescavadeira com a minha netinha de um mês… ali meu corpo não aguentou.”
Essa é a segunda grande enchente enfrentada por Eldorado do Sul em pouco mais de um ano. Em 2024, cerca de 90% da cidade ficou submersa. Agora, mais de 12 mil moradores foram atingidos novamente. Três mil pessoas ainda não conseguiram retornar para suas casas, e cerca de 40 permanecem nos abrigos temporários organizados pela prefeitura.
A cabeleireira Gleci Andara voltou para casa na última sexta-feira, mas diz viver sob constante insegurança. “Dá um desânimo enorme. Se eu pudesse, não voltava. Preferia ir embora e recomeçar longe daqui.”
Já a comerciante Jurema Rodrigues, que perdeu tudo na enchente anterior, relata mais uma vez prejuízos significativos. Ela precisou fechar seu mercado por duas semanas. “Não tenho condições financeiras de sair daqui. Então fico, torcendo para não acontecer de novo.”
Eldorado do Sul ainda contabiliza as perdas materiais, mas é o trauma invisível que muitos moradores carregam no retorno para casa que mais desafia a reconstrução.